segunda-feira, 8 de setembro de 2014

Quem apoia o Hamas?

Se formos a acreditar nos que consistentemente apoiam toda e qualquer acção violenta do governo de Israel, toda a gente que mostre a mais pequena dúvida em relação à violência de Israel parece ser um apoiante fanático do Hamas. Afinal de contas, só mesmo um militante fundamentalista islâmico é que alguma vez se poderia emocionar com o sofrimento das crianças de Gaza. Alguém mais "humanista", como um comentador de um dos meus recentes artigos diz que "não choro nem um pouco a morte de um terrorista, mesmo que ele tenha 5 anos de idade". 

O nível de desumanidade que tenho encontrado nas caixas de comentários deste blogue tem-me ajudado a abrir os olhos em relação a um fenómeno estranhíssimo: o nível de violência que a generalidade das pessoas apoiam. Quer os que defendem Israel quer os que defendem a Palestina. É comum ver gente a desejar a morte de todos os Judeus, tanto como ver outros a clamarem pela homicídio de todos os Muçulmanos. Nunca quis acreditar que de um lado e doutro as principais motivações sejam algum tipo de instintos primários de anti-semitismo e islamofobia, mas talvez tenha que rever isso um destes dias.

Já aqui escrevi várias vezes sobre o Hamas, mas como alguns leitores insistem em acusar-me de apoiar o Hamas, aqui vai o que eu penso deles: O Hamas é uma organização terrorista. A sua legitimidade democrática (uma vez que ganharam as últimas eleições livres da Palestina) não altera o facto de utilizar tácticas terroristas, ou seja, é um grupo terrorista que não soube dar o salto para ser um partido político de pleno direito, como aconteceu a muitos outros movimentos terroristas espalhados pelo mundo. A execução sumária de várias pessoas acusadas de espiarem para Israel nos últimos meses, sem qualquer julgamento ou oportunidade de provar a sua inocência mostra o total desrespeito pelos mais básicos conceitos de justiça. Também não tenho dúvidas de que a ascensão do Hamas é o resultado directo da incompetência e corrupção da Fatah, o partido de Yasser Arafat, assim como da política de violência indiscriminada de Israel que resultou na primeira intifada.


Shimon Peres e Mahmoud Abbas
O Hamas cresce por cada nova guerra com Israel. Para o mundo árabe, a sua legitimidade enquanto único poder em todo o mundo islâmico que ainda luta contra Israel torna-o especial aos olhos da população árabe e muçulmana. Noutras ocasiões, foi o Hizbullah que conseguiu esse tipo de unanimidade, mas logo a seguir a 2006, quando teve o seu pico de popularidade, a sua energia vem-se perdendo e vê-se agora envolvido na guerra civil Síria do lado do exército de Bashar Al Assad, ou seja, a lutar contra os muçulmanos Sunitas quer moderados quer fundamentalistas. 

Pelo contrário, a Fatah e o seu líder Mahmoud Abbas, vão perdendo apoio enquanto mantém a difícil tarefa de controlar a sua população nestas alturas difíceis em que os palestinianos vêm o seu povo a ser bombardeado em Gaza. São obviamente vistos como colaboracionistas e como fracos, e quando a sua política de apaziguamento é traída pelo anúncio de novos colonatos israelitas na Cisjordânia, onde meio milhão de judeus já se encontram em colonatos ilegais, a sua legitimidade cai por terra.

Se o Hamas beneficia politicamente de cada nova guerra, que é que dá ao Hamas essa oportunidade a cada par de anos senão Israel? Talvez pudesse ser apenas por estupidez e incompetência. Afinal de contas, logo nos primeiros dias de guerra já dava para saber que o Hamas sairia politicamente vitorioso e que o governo de Israel sairia derrotado

Agora lemos os jornais israelitas a atirarem em cima de Benjamin Netanyahu[1], que já teve que despedir um dos seus ministros[2], enquanto do outro lado do muro as sondagens dão agora vitória ao Hamas numa eventual eleição palestiniana[3] algo que não surpreenderá quem viu a festa espontânea feita em Gaza assim que o cessar-fogo foi anunciado.

Se eu, que não tenho qualquer experiência política consegui facilmente e sem quaisquer dúvidas prever este desfecho como é que Netanyahu e o seu governo não o conseguiram? Provavelmente não será estupidez ou incompetência, apenas algum aventureirismo e uma continuação da famosa política de "corte de relva", ou seja, Israel não pretende resolver problema nenhum, apenas manter o status quo, impedir a criação do estado palestiniano, manter o Hamas politicamente forte e militarmente fraco e a Fatah comprometida e desacreditada enquanto lhe vai roubando território, um colonato de cada vez.

Quem apoia o Hamas? Eu não sou de certeza. Israel, a avaliar pelos seus actos, talvez...  

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